Manuscrito:‌ ‌escrevendo‌ ‌e‌ ‌pintando‌ ‌arte‌ ‌

Por Mariana Ornelas 

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Você, leitor de um site, dentro do mundo cibernético, com redes sociais, informações a milhão, fotos, vídeos, áudios e tudo o que temos direito (ou não), consegue imaginar viver sem isso? Pois bem, ainda existem pessoas que vivem com nada ou quase nada deste nosso modo de viver dentro da sociedade da internet. Manoel Cavalcante de Souza Neto, carinhosamente chamado de Manu, vive assim! Apenas com um e-mail e uma página no Facebook na qual adiciona sua arte, isso bem de vez em quando.

Para conseguir fazer este perfil, precisei entrar em contato com dois professores da UEL (no qual somente um me respondeu com o e-mail de Manu, o professor do Departamento de Arte Visual, Danilo Villa). Depois disso, enviei um e-mail a Manu pedindo uma entrevista pelo aplicativo “Zoom” e ele me respondeu: “Mas que zoom é esse?”. Então, tentei via WhatsApp, Manoel me disse que não possui redes sociais e me passou um telefone para que eu pudesse ligar e marcar a entrevista por e-mail. 

Detalhe: nunca fiz entrevista por e-mail. Liguei. A ligação durou exatos 52 segundos, mas Manu foi muito bondoso e preciso, apesar do pouco tempo. Só combinamos de nos comunicar via e-mail, porque o computador dele não está funcionando e ele iria a uma Lan House me responder. Assim, conversei um pouco com o professor Danilo Villa sobre Manu, pesquisei a vida dele e li já outros perfis que produziram sobre ele. Toda essa história para dizer: Manu vale a pena ser escrito. Por isso o nome do título e a conversa por e-mail, como já ouvi antes: palavras faladas voam, escritas, ficam. 

Servidor desde 1981, Manu começou seu trabalho no antigo Cine Vila Rica como pintor de painéis que anunciavam os filmes que entrariam em exibição. “O rapaz que pintava no Cine Teatro Universitário Ouro Verde teve que se ausentar para o serviço militar e não fez os trâmites legais para garantir seu emprego de volta, então fui chamado para fazer alguns painéis nesse meio tempo, o diretor da Casa de Cultura da época gostou muito do meu trabalho e decidiu me contratar em definitivo! Meu registro na UEL foi no dia 01/04/1981, faz 40 anos que trabalho na UEL, dos quais 24 foram no cine Teatro Ouro Verde, fui realocado no Departamento de Arte Visual/ CECA em 2005, onde continuo até hoje (embora afastado por conta da pandemia)”.

Manu também foi estudante do curso de Arte Visual e disse que mudou sua perspectiva sobre o que pensava sobre arte, falou também da vontade familiar que persistiu para que fizesse uma graduação. “Meu finado pai tinha um sonho: de ver seus filhos com uma boa escolaridade e desde jovem sonhei em cursar uma faculdade e não seria outra senão Arte, isso tornou-se possível quando me transferi do Ouro Verde para o Departamento de Arte Visual no CECA. Achei maravilhoso, me realizei, expandi meus conhecimentos, quebrei vários tabus e preconceitos que carregava comigo em relação à Arte Moderna e Contemporânea!”. O professor Danilo Villa também foi docente de Manu e trabalhou com ele no Departamento de Arte Visual e na produção de painéis no Divisão de Artes Plásticas da UEL. Villa disse que o aluno e também colega de trabalho fala maravilhas sobre a forma que Manu faz o painel, mas não só: “A gente dá uma arte para ele reproduzir em tamanho A4 e ele, com uma régua e os óculos que ele enxerga pouco, coloca o rosto no painel e pinta que é uma maravilha. O Manu é uma pessoa incrível, de trato fácil, muito simples, querido, agradeço muito todo a história e o trabalho que ele tem conosco na Divisão de Artes Plásticas (DAP).”

Manu não produz só cartazes e painéis de exposições, peças e filmes; ele também reproduz imagens de fotografias por encomenda. Mas lembra cuidadosamente dos anos que trabalhou no Ouro Verde e viveu coisas inesquecíveis: “Não me sai da memória os shows inesquecíveis do Projeto Pixinguinha, a criação da Orquestra Sinfônica da UEL pelo saudoso maestro Othônio Bemvenuto, os concertos memoráveis de grandes orquestras, os Concertos Matinais aos domingos, os festivais de teatro da Nitis Jacon, o Festival de Música de Londrina, grandes montagens de óperas. 

Ouro Verde, que chama de segunda casa, quando perguntado os trabalhos mais memoráveis que fez, responde: “Meus melhores trabalhos lá foram: Os Caçadores da Arca Perdida, Asa Branca, Um Sonho Brasileiro, Em Algum Lugar do Passado, Erendhira, O Grande Mentecapto e outros...” Incrivelmente, mesmo depois de anos de trabalho entre painéis e outras produções, Manu não se considera um grande artista. “Nunca me considerei um bom artista, a partir de meu aprendizado em cinemas, sempre me considerei um artista com muito boa técnica, principalmente no desenho e na pintura, desenvolvi uma boa técnica na arte de gravura também, travo muito na hora de criar. É sempre um novo desafio, na maioria das vezes fico até alta madrugada refletindo sobre o trabalho, como começar, o que devo fazer, qual melhor estratégia, a preparação das cores”.  

Sobre seu período como estudante, Manu também guarda boas lembranças: “Foi muito interessante pois me senti rejuvenescido, a irreverência deles me encabulava a princípio, depois fui ficando meio sem vergonha, às vezes até me enternecia e fui me acostumando.” Sobre os docentes que também eram amigos de trabalho, Manu afirmou que as trocas de experiências dentro e fora da sala de aula ajudaram no seu crescimento profissional. 

Desde criança Manu tem aptidão pelo desenho e pela pintura, há mais de 40 anos desenvolve um trabalho excepcional dentro e fora do Departamento de Arte Visual da UEL. Tem orgulho de ter estudado e trabalhar na instituição: “A satisfação, o prazer de fazer parte da história de uma instituição de ensino das mais conceituadas do país e do mundo!” Temos muito a escrever sobre ti, Manu!