Fundo Patrimonial: uma alternativa para as Universidades?

O tema dos fundos patrimoniais, criados na maioria das vezes por ex-alunos das instituições, vem ganhando cada vez mais força. Os chamados "endowments" foram regulamentados no Brasil em 2019. 

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Em agosto, a Universidade Estadual Paulista (Unesp) oficializou o início do funcionamento de seu fundo patrimonial, ou endowment fund, um instrumento institucional para o estabelecimento de parcerias de longo prazo com a finalidade de fomentar investimentos em projetos que fortaleçam a missão da universidade. A doação de R$ 1 milhão efetuada pela família Nishimura, controladora da Jacto, empresa fabricante de máquinas agrícolas marcou a ocasião quando também  também foi assinado um instrumento particular de parceria entre o geólogo egresso da Unesp, Hilton Magri Lúcio, presidente do Conselho de Administração da organização gestora do fundo patrimonial da Unesp, chamado Associação Prospera Unesp, e o professor Pasqual Barretti, reitor da universidade.

Os recursos captados via endowment são perpetuados por meio do fundo e apenas os rendimentos das aplicações financeiras são utilizados. O Prospera passará a ter um Comitê de Investimento, que fará recomendações sobre a política de investimentos e as regras de utilização dos recursos do fundo patrimonial, a partir do momento em que atingir o valor de R$ 5 milhões. De acordo com as regras do fundo patrimonial da Unesp, fica proibido investir dinheiro em despesas recorrentes, tais como pagamento de salários, contas de energia, aluguéis etc. Os recursos a serem investidos na universidade serão destinados a projetos não recorrentes, como aqueles concebidos para a resolução de problemas específicos da sociedade e para inovação tecnológica, entre outros.

O tema dos fundos patrimoniais, criados na maioria das vezes por ex-alunos das instituições, vem ganhando cada vez mais força. Os chamados "endowments" foram regulamentados no país em 2019. Por definição, os fundos patrimoniais (filantrópicos ou endowments) são estruturas criadas para proporcionar sustentabilidade financeira a instituições públicas ou privadas sem fins lucrativos e/ou para a execução de programas e projetos de interesse público. As doações recebidas ficam recolhidas em aplicações, e apenas os rendimentos podem ser resgatados e utilizados para financiar causas ou parte do funcionamento de organizações. 

O modelo é mais antigo que o próprio ensino superior brasileiro; existe há mais de dois séculos em países como os Estados Unidos onde, de acordo com um levantamento do jornal U.S.News, que elabora um ranking de universidades daquele país há décadas, em universidades de excelência como Princeton e Dartmouth, metade dos egressos doam a "endowments". No Brasil, a capacidade de arrecadação ainda engatinha mesmo com resultados bons como aqueles do Instituto Reditus – fundo patrimonial da UFRJ que arrecadou R$ 10 milhões no primeiro ano de captação, que coincidiu com o início da pandemia de Covid-19​. As doações vieram de mais de 200 pessoas. 

A ideia do Reditus começou antes da lei de 2019, há mais de dez anos, com uma espécie de cofinanciamento de bolsas de estudos no exterior. Um egresso da UFRJ pagava a bolsa de intercâmbio de um aluno que, depois de se formar, pagaria a bolsa de alguém que ainda estava estudando. Depois, resolveram escalar a iniciativa com o fundo. A Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) também já tem o seu Fundo Patrimonial, o Patronos. A ideia surgiu durante um intercâmbio: os fundadores do fundo estudaram em universidades com "endowments" bilionários, como Yale e Harvard. Resolveram trazer a ideia para o Brasil.Hoje, o Patronos tem um patrimônio de R$ 1,6 milhão, arrecadado com cerca de 200 doadores. A Unicamp, aliás, conta com outro fundo, o Lumina, primeiro no país criado oficialmente pela própria instituição. As doações são geridas e administradas por uma organização gestora, com a qual a universidade firmou parceria e é beneficiária. 

Desde a regulamentação de 2019, os fundos têm se espalhado em universidades como a PUC Rio —criado no mesmo ano da lei—, Universidade de Brasília (UNB) e UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Também há fundos até em "células" dessas instituições —caso do Sempre Sanfran, da Faculdade de Direito da USP. Criado em 2011, o Amigos da Poli é o fundo patrimonial da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), e neste ano vai investir R$1,3 milhão na entidade. O fundo acumula atualmente R$ 41 milhões de patrimônio. 

As instituições de ensino superior públicas e privadas podem se beneficiar dos fundos patrimoniais, mas ao que parece, a alternativa ainda esbarra em questões culturais. Uma delas é a falta de estímulo por doações, como afirma o advogado especialista em educação, José Roberto Covac. “Culturalmente, temos esse olhar de apoio ainda muito voltado a uma responsabilidade do Estado, vinculado às políticas públicas como o Fies e o ProUni. Por outro lado, com o advento da pandemia, todas as IES tiveram que buscar alternativas para atrair e manter seus alunos, e essa lei pode contribuir para uma arrecadação além da mensalidade ou dos programas estabelecidos pelo governo”, diz. Para o especialista, as IES privadas deveriam pensar muito na possibilidade de criação de endowments, imaginando um projeto que envolva principalmente seus ex-alunos. “O egresso hoje tem grande importância, ele é um grande acervo da instituição”, afirma Covac.

Uma vez que os fundos patrimoniais são entidades próprias com CNPJ, governança é essencial para a transparência; fator também já estabelecido na lei. Além das formalidades necessárias para a construção desses fundos – até para que a sociedade se envolva com eles – têm os critérios de natureza contábil, de transparência, integridade, comitê de ética, um site que demonstre um relatório das atividades e, e ao mesmo tempo, que possua órgãos deliberativos: um conselho administrativo, fiscal e de investimentos.

 

Com informações do Jornal da USP, Jornal da Unesp, GIFE,  Folha de S.Paulo