Toda as vezes em que ensinei, também aprendi algo

Maurício Arruda, arquiteto, designer e apresentador de uma das temporadas do programa Decora, no GNT, rememora sua passagem pela UEL

Por: Mariana Ornelas

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Imagine: você é um adolescente recém-aprovado em uma universidade pública. É nerd, gosta de estudar e está ansioso para aprender. Mas um dia, em uma aula do curso que você escolheu, o professor olha bem no meio da sua cara e diz: “Você é um excelente aluno, só que está no curso errado”. O professor indica: “Saia daqui do CESA (Centro de Estudos Sociais Aplicados) e vá andando pelo calçadão até chegar à biblioteca. Vá em frente mais um pouco e você vai encontrar o Departamento de Arquitetura. É lá”.

Maurício Arruda é um londrinense que, como muitos, começou “entrando no curso errado”. Não chegou a terminar sequer o primeiro ano de Administração na Universidade Estadual de Londrina e já mudou, cheio de novas expectativas, para o curso de Arquitetura. “Quando cursava ADM, eu fazia muito desenho de observação das pessoas em sala de aula. Eu ficava o tempo todo desenhando e desenhando”. O interesse tão evidente não passou despercebido por um de seus professores, e Maurício fez o que ele pediu. Visitou o CTU (Centro de Tecnologia e Urbanismo), prestou outro vestibular e encontrou sua paixão.“O grande legado da minha formação na UEL foi mesmo a sua abrangência. Isso de você conseguir visualizar todos os aspectos diferentes da profissão e todas as possibilidades que ela te dá, também do ponto de vista social, político, estético, e assim criar um senso crítico para você se colocar como profissional no mercado”, afirma Maurício.

Desde o início do curso de Arquitetura, Maurício se interessou pela casa, pela experiência do morar e sobre como as pessoas se comportam no lar. “Naquela época, meus colegas apresentavam Trabalhos de Conclusão de Curso com projetos arquitetônicos para grandes shoppings, grandes obras, o que também é importante. Mas eu tive mais interesse em estudar sobre casas. Meu trabalho final foi sobre a habitação de interesse social, sobre casas construídas com madeira de reflorestamento e em processo de mutirão. Depois eu me aprofundei sobre isso no Mestrado que fiz na USP”.

A integração da Universidade com a cidade foi algo que também marcou os anos universitários de Maurício Arruda em Londrina. “Uma coisa muito marcante para mim foi o calçadão de Londrina. Minha avó morou no calçadão e depois, durante a faculdade, eu frequentava o FILO, no Teatro Ouro Verde. Foi a primeira vez em que entrei em contato mais profundo com a música, o balé, a dança... E a qualidade do que eu via ali era excepcional. Essa efervescência cultural de Londrina também foi muito importante para minha formação”.

Outro aspecto de Londrina que se revelou a Maurício durante o curso foi a própria arquitetura da cidade. Ele conheceu as casas construídas nas primeiras décadas da colonização local através das aulas do professor Antônio Carlos Zani. Especialista na arquitetura londrinense feita em madeira, amplamente utilizada entre as décadas de 1920 e 60, Zani é autor de diversos trabalhos sobre o tema, incluindo o livro Repertório das Casas de Madeira em Londrina (Eduel, 2005). Entre inúmeros projetos, o professor também foi o responsável pelo projeto da Capela Ecumênica do campus da UEL, que é uma réplica da primeira Catedral de Londrina, construída em peroba rosa.

Para além da singularidade histórica, estudando com o professor Zani, Maurício também teve valiosas lições de sustentabilidade, aprendendo sobre como utilizar a madeira nos dias de hoje, com responsabilidade ambiental. Essa experiência marcaria sua carreira como arquiteto e designer, e pode ser observada, por exemplo, na linha de móveis Londrina, inspirada nos métodos de construção dos pioneiros locais e que utiliza madeira de reflorestamento.

Mais conhecido por seu trabalho como designer, arquiteto e apresentador de televisão, Maurício também teve uma boa experiência profissional atuando como professor. Pouco depois que concluiu a graduação, ele lecionou durante dez anos em instituições como IED – Instituto Europeo di Design, Escola Panamericana de Arte, SENAC e SEBRAE. De certa forma, foi sua verve de educador que o levou a se tornar apresentador do programa Decora, no GNT. “O que me motivou a ir para a televisão foi ensinar as pessoas sobre decoração. Eu fui professor de Design de Interiores e Produto de 2001 até 2011. Meu primeiro emprego como arquiteto foi ser professor. Então eu fui para o Decora com essa cabeça de professor, de querer inspirar as pessoas”.

No programa, Maurício Arruda atendia a pedidos de telespectadores que desejavam repaginar o ambiente de suas casas. Foram cinco anos de Decora, com 115 reformas realizadas durante 115 programas. “Eu redescobri o sentido da minha profissão: não era sobre mim, era sobre os outros”.

Atualmente, além de continuar atuando como arquiteto e designer, Maurício é também uma espécie de digital influencer – rótulo que, com 833 mil seguidores no Instagram, ele vê com certa reserva. “No Decora eu percebi a diferença entre ser influencer e ser criador de conteúdo. Então eu foco meu trabalho em criar conteúdos que sejam realmente relevantes e inspiradores para as pessoas”.

Seu séquito de admiradores nas redes sociais não cansam de pedir seu retorno para a televisão. Segundo Maurício, o que não falta é vontade. “Eu deixo a minha assessora louca!”, ri o arquiteto. “Eu quero fazer de tudo e mais um pouco, e ela vive me alertando: ‘não vai dar tempo!’. Mas eu gosto mesmo de desafios, sempre quero inovar e é isso que me motiva. A experiência e a maturidade ajudam muito: eu aprendi a não guardar nada para mim. Por isso gosto de trabalhar com comunicação. Toda as vezes em que eu divido alguma coisa que sei, também aprendo outra”.

O desejo de ensinar e aprender, que transborda em Maurício e o move em diversas direções, parece ter tudo a ver com sua experiência na Universidade Estadual de Londrina. E não apenas com o que ele ouviu em sala de aula. O arquiteto lembra que outro espaço da Universidade também foi de uma importância equiparável: os corredores, onde as conversas com outros estudantes funcionavam como um método involuntário de aprendizagem. “Trocar ideias com pessoas de outros cursos me ajudou a me desenvolver muito como indivíduo”.

Também ainda estão bem vivas em sua memória as sonecas tiradas nos intervalos das aulas e as festas no Centro Acadêmico de Arquitetura, em uma época em que elas ainda eram permitidas no campus. Outra lembrança incontornável para Maurício são os ipês, uma das principais espécies de árvores que povoam a UEL. “Uma das imagens mais lindas que eu tenho na mente é a memória do tapete branco de flores de ipê que se formava em frente à Biblioteca Central. Era lindo”.

Algumas coisas não mudaram tanto desde a formatura de Maurício, no ano de 1997. Os ipês continuam na UEL e embelezam o campus a cada outono. E além dos ipês, todos os fins de semestre, diversos Arrudas também brotam, levando consigo (e para os outros) tudo o que aprenderam na Universidade.