A Alumni UEL acompanhou a Audiência Pública no Centro Cultural Kaingang VÃRE, na região Sul de Londrina, na última quarta-feira (18). O encontro foi convocado pela Comissão de Conflitos Fundiários da Justiça Federal e contou com a presença de representantes do Ministério Público, da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), de lideranças indígenas e entidades que atuam na defesa de direitos dos povos originários.
O processo que exige a desocupação do espaço, que abriga 32 famílias, foi tema de audiência pública realizada no Centro Cultural, na última quarta-feira (18). Convocado pela Comissão de Conflitos Fundiários da Justiça Federal, o evento contou com a presença de representantes do Ministério Público, da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), de lideranças indígenas e entidades que atuam na defesa de direitos dos povos originários.
Maria Eugênia de Almeida Pinto, do Conselho de Articulação Institucional e Relacionamento Comunitário da Alumni UEL acompanhou a audiência e relatou o incômodo ao perceber a maneira como a comunidade indígena é tratada."É como se fosse uma ocupação irregular. E não é! Existe documentação da cessão desde 1998.A intenção de tirá-los dali foi desejo de várias administrações. Os indígenas resistem, sem nenhum apoio jurídico ou assistência social. Essas ações parecem serem feitas com o objetivos de provocar o cansaço mas o espaço é estratégico e histórico para eles e acreditamos seja também um direito de permanecer ali", comenta.
O Portal Verdade acompanhou toda a movimentação e a matéria produzida pela jornalista Franciele Rodrigues conta dos detalhes da Audiência Pública que reproduzimos a seguir:
Vigiados por uma viatura da Rotam (Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas) e cerca de 10 policiais militares, indígenas que residem no Centro Cultural Kaingang VÃRE, na região Sul de Londrina, protestaram contra a ação de reintegração de posse, imposta pela Prefeitura.
“Os parentes Kaingang tem todo o direito de ficar neste chão porque este chão sempre foi dos Kaingang. Diante disso, eu queria trazer meu olhar enquanto psicóloga porque eu vi que tem um carro de polícia aqui, mas não vi nenhuma ambulância para acolher os parentes que estão com crise de ansiedade porque a gente sabe o que é sofrer ataque do estado”, observa Ana Lúcia Ortiz, indígena Guarani Ñandeva.
Em 2015, a Prefeitura de Londrina entrou com pedido de reintegração de posse e em 2017, uma decisão favorável ao município foi publicada. A Funai recorreu, mas no ano passado, o Tribunal Regional Federal deu ganho de causa ao município.
Os indígenas se recusam a deixar o local e apresentaram documentos da Prefeitura, de 1998, que preveem a construção de casas e do Centro Cultural.
“A comunidade reivindicou, gritando que querem a permanência aqui mesmo. Desde 2000 foi anunciada a construção do espaço pela Prefeitura para os indígenas mostrarem a sua cultura, as suas tradições, o seu costume, artesanato. Já decidiram nos cânticos também e mostraram a sua reação que querem ficar aqui mesmo, não tem outro negócio, não tem dinheiro que paga a história”, aponta o cacique Renato Kriri.
“Falam que foi invasão, mas foi uma concessão pacífica para a comunidade na época, não tem invasão alguma. E como que eu sou réu também sendo que foi doado? É muito injusto. Eu quero que alguém me explique porque que eu levei esse processo”, acrescenta a liderança.
O juiz federal Bruno Silva Santos espera mediar uma solução entre os indígenas e o poder Executivo local. “Até o momento, não há uma disposição do município de Londrina para que eles fiquem aqui. Então, viemos saber se havia a possibilidade deles irem para outro local, mas o que eles disseram é que não aceitam ir para outro espaço”, sinaliza.
Reforma fica na promessa
O Centro Cultural Kaingang VÃRE está localizado às margens da avenida Dez de Dezembro, há aproximadamente 100 km da Terra Indígena Apucaraninha.
As moradias possuem infraestrutura precária, sem acesso à água potável, saneamento básico e energia. As famílias dependem de apenas um banheiro alocado no Centro Cultural.
“Não tem educação, não tem saúde específica para atendimento de indígenas, que é um direito nosso. Não tem saneamento básico e escutamos o discurso que os indígenas não podem morar na beira de lago, mas na Gleba [Palhano] tem gente morando e ninguém fala nada”, adverte Ortiz.
A comunidade também denuncia a falta de cumprimento de promessas antigas de reforma e ampliação do Centro Cultural Kaingang. Documento da Prefeitura, datado de 2011, anunciava recursos para essas melhorias, mas até hoje, nada foi feito.
Conforme informado pelo Portal Verdade, em abril de 2024, a necessidade de improvisar energia levou a um incêndio, que destruiu casas, além de causar a perda de móveis, roupas e outros pertences.
Flora Mestre Passini, médica de família e comunidade, integrante do AgPopSUS (Programa de Formação de Educadores e Educadoras Populares de Saúde) reforça a importância do Centro Cultural Kaingang VÃRE para o acolhimento de indígenas, inclusive, de outras etnias.
“Acho que seria um golpe político forte, porque o lugar é um apoio para quem passa por aqui para vender artesanato, estudar nas universidades, trabalhar, muitos por dificuldade de auto subsistência na aldeia. Outros que procuram para acessar um serviço de auto complexidade de saúde, entre outros serviços públicos”, diz.
Ainda, na avaliação de Passini, retirar os indígenas do local também afetaria a manutenção de laços e o modo de vida, assentado no bem-estar coletivo, na harmonia com a natureza e a espiritualidade.
“Retiraria esse local que eles interagem não só por necessidade, mas também para a valorização da cultura. O espaço promove a cultura não só Kaingang, mas de outras etnias, existe esta troca. Perderia toda essa valorização e do modo de vida que respeita o meio ambiente, a coletividade, a cidade inteira perde”, acrescenta.
Para a comunidade, a urgência não é a remoção, mas a demarcação da terra, o que possibilitaria fortalecer o acesso a políticas públicas.
“A própria Funai não consegue ter uma representação forte, necessária. O cacique faz muito o papel das entidades. Na cidade, estão aprendendo a exigir os direitos porque além de tudo, tem muito preconceito, má vontade. A gente percebe nas falas, o impacto cotidiano do racismo. A educação parece fluir mais, mas também tiveram que lutar muito para ter professor bilíngue. Sendo o espaço institucionalizado, uma terra indígena demarcada, facilitaria acessar os direitos”, indica Passini.
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