Dia de Crônica: o amor e orgulho pela UEL

O jornalista, escritor, membro da Academia Paranaense de Letras e membro da Alumni, Nilson Monteiro,  escreve sobre a UEL do começo da década de 70 e declara todo o seu amor à instituição na crônica "Amor de Filho". 

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AMOR DE FILHO
Amo a Universidade Estadual de Londrina, que, em resumo carinhoso, é UEL, depois de ser FUEL. Sim, quando a conheci era uma Fundação e estudantes só ficariam livres de suas mensalidades em 1991, quando foi estadualizada.
 
Nomenclaturas à parte, em 1971 prestei meu primeiro vestibular, para História, e deixarem-me careca, calouro. Parecia vindo de Marte, mas universitário.
 
Nossas aulas eram no centro da cidade, no Hugo Simas, junto a outros cursos da instituição naquela época. O reitor, Ascêncio Garcia Lopes, teve importância elástica não só para estruturar a universidade, mas também para incentivar o movimento universitário, apesar dos dentes da Ditadura.
 
Lopes construiu no pátio do Hugo Simas a primeira sede do Diretório Central do Estudantes (DCE). Ali, no movimento estudantil, a participar dos diretórios acadêmicos e de suas lições, com derrotas e vitórias, acendi a chama da esperança.
 
E de uma derrota, veio a criação do jornal “Poeira”. Nascido de um verso de Paulo Vanzolini (“Levanta, sacode a Poeira e dá a volta por cima”), um jornal para se erguer contra os desmandos dentro e fora da universidade, como representante do mais amplo e aguerrido movimento universitário de que se tem notícia no país.
 
Enquanto isso, aulas. De minha parte, saí do curso de História por incompatibilidade com um de seus professores, padre Carlos Weiss. Era charuto e verdade absoluta demais para meu olfato, mas ele teve importância para a cidade, reconheço, ao criar o Museu Histórico, ao lado da simpática Zuleika Scalassara.
 
Depois, fomos para o recém-inaugurado Campus, às margens da rodovia PR-445, de centros de estudos feitos com grandes blocos de concreto e ruelas barrentas em seus 235 hectares, em meio a perobas rosas, cheiro de mato, barro e aventura. Tenho certeza de que um pedacinho de meu coração ficou enterrado ali.
 
Fui mudando de curso (Letras Vernáculas, Letras Anglo e finalmente, Letras e Literatura Francesas), de acordo com a compatibilidade em meu trabalho, a Comunicação, em jornais que virariam a ponta de um rosário ao longo de meio século.
 
Às vezes, me quedava, solitário, em meio ao nada do campus, e ficava olhando-o como filho olha para mãe. Percorria suas ruelas como veias abertas, espaços vazios, vultos enormes de árvores, seus chãos de lama vermelha, suas escadarias, suas salas e palavras, seus caminhos, dentro de mim. O verso de Neruda palpitava - “Se preparó como una larga lanza”, em plena noite de Lautaro.
 
Nos cursos que fiz, professores são um pedaço dessa minha mãe. Inclusive, nas matérias eletivas de Jornalismo. Tantos.
 
Outros mais, como integrantes do Conselho Universitário, do qual, junto à Célia Regina de Souza, fui representante discente, nos anos 1975/76, período para o qual também fui eleito presidente do DCE.
O discurso de posse (no Canadá, pois havia ameaças de bombas no Teatro Universitário) e escrito por dezenas de mãos, foi emocionante. Marcávamos de vez a posição da maioria dos universitários diante da Ditadura, com indiferença da Reitoria e participação da vergonhosa Assessoria Especial de Segurança e Informações (AESI).
 
Em 1975, em Curitiba, reivindicamos a federalização da FUEL, com um abaixo-assinado de 5 mil estudantes em mãos (quase o total de universitários da instituição), ao general Geisel. Não houve resposta.
Enquanto isso, latejava meu coração de filho, com carinho adolescente, ao saber de iniciativas emocionantes dentro da universidade, entre inúmeras em seus centros de estudo, como o funcionamento do Hospital Universitário e o sopro maiúsculo ao SUS e à medicina preventiva.
 
Em 1977, peguei meu passaporte para fora da universidade, em formatura no Moringão, com longos cabelos e emblemática bolsa de couro a tiracolo.
 
A vida seguiu, aqui e acolá, por onde ando e por onde sonho.
Sempre estive de olhos grudados nos avanços e retrocessos da instituição, pois, afinal, segundo Darwin, a espécie evolui, mas nessa evolução há acertos e erros, não há como disfarçá-los.
 
A UEL foi modelando seu corpo, tornando-o mais acessível ou, trocando em miúdos, democrático. Hoje, abre-se a 17 mil estudantes. Há eleições diretas para a Reitoria, Centros de Estudos... E a possibilidade de o amor filial crescer ainda mais.
 
Por exemplo, recentemente, o Conselho Universitário da UEL, em vez de, como em meus tempos, ratificar ou não decisões mais ou menos arbitrárias da Reitoria, aprovou uma campanha institucional, envolvendo toda comunidade universitária, tendo como tema: "UEL, em defesa das liberdades democráticas, da autonomia universitária, das universidades públicas e do SUS".
 
Dispara no peito o orgulho de filho e não dá para segurar.
 
Nilson Monteiro
Fotos: Arquivo Pessoal